agosto 18, 2011

ROSAS E VINHO TINTO

* Estória de Rayssa Francine. Co-autoria: Joyce Martins


Holly não sabia quando havia começado com aqueles sonhos, mas uma coisa estava certa: Eles tinham o poder de deixá-la calma e mais harmoniosa com sua realidade. A princípio, ela não acreditava em sonhos e em muito menos que eles pudessem ser alguma projeção de sua realidade. Já havia lido muito acerca deste assunto e se inscrevera nos tempos de faculdade numa disciplina a qual falava muito de um estudioso do começo do século XX, o qual havia desenvolvido um estudo sobre sonhos. Tudo era muito esquisito, no início, ela não conseguia muito entender, embora o que significava esquisito para Holly, cada vez a instigava mais para procurar saber e desvendar muitos e muitos mistérios sobre tantos assuntos. Era uma curiosa culturalmente assumida.

Na noite passada recordara quando era criança. Tinha sido uma garota extremamente mimada por seus pais. Era filha única, tinha tudo aos seus pés e possuía uma grande exigência diante a tudo que queria e pedia muito, especialmente brinquedos para aderir-se a sua enorme coleção. Seu pai era um médico cardiologista conhecido na cidade e sua mãe, uma psicanalista, a qual passava todo seu tempo trabalhando em um hospital voltado a pacientes com distúrbios mentais. Eram pais ocupados e Holly havia sido cuidada principalmente por babás de alta classe, daquelas com um currículo de invejar qualquer um. Mas, o que ela mesmo gostava era de ganhar muitos presentes, tinha sido acostumada num mundo cheio de materialismo, seja na companhia ou na ausência de seus genitores.

O tempo havia passado, e muito, Holly pensou, ela tinha se tornado uma mulher, sentindo-se madura e realista, embora como todo ser humano, havia passado por alguns deslizes emocionais. Seus pais então, moravam agora em outra cidade, mas, sempre tirava um tempo para visitá-los. Sentira que estava se levando a um momento somente dela, estava adulta e aquele mundo de presentes, brigas em escola e muita confusão poderia considerar praticamente, situações do passado, o que apenas a fazia recordar, como naquela noite.

Cansada de uma vida corrida de trabalho, Holly havia começado a ficar abatida e cada vez mais preferindo estar em casa. Seu trabalho não era mais sua prioridade, havia conquistado muito sendo uma boa arquiteta de sucesso, só que não havia forças para sair, para diversão e muito menos para pensar em projetos arquitetônicos.

A vida na cidade grande tinha a deixado de cabeça para baixo, tudo que queria mesmo era está em seu novo lar, uma casa muito graciosa no meio da floresta, com um lago que dava para ser visto da sua varanda e um jardim extenso, mas por curiosidade não brotavam flores nem frutos, só havia mesmo arbustos velhos e árvores antigas, sem o verde vibrante da extensa vegetação que a cercava.

Holly queria mesmo deita-se novamente e as horas não eram de seu interesse, aquilo poderia fazer quantas vezes ela desejasse durante o dia, o mais importante era está em sua cama, fechar os olhos e está na companhia de suas visões fantásticas que seu inconsciente produzia e a deixava como tivesse se transportado a outro mundo, assim até adormecer e entrar de vez num universo de sonhos.

Mas ela não prestara a atenção que, ultimamente, seus sonhos estavam fixados em um só mundo: Ela se transportava junto ao seu inconsciente numa terra desconhecida povoada de vampiros e muitos seres encantados. Muitos desses vampiros a cuidavam e a transformara como ser parte deles, juntos voavam para muitos e muitos horizontes. Festas, alegrias, romances, muita música e união era o que aquela terra vivia, diferente do que se sabia sobre vampiros, eles não eram perigosos, fixados apenas em sangue ou embora vivessem longe do habitat comum do planeta, eles eram seres de uma beleza inigualável e estonteante, sabiam conviver em harmonia, como se divertir e como amar uns aos outros de uma forma como ninguém mais sabia.

Na manhã seguinte, ainda embalada naquele pensamento, Holly tomava uma xícara de leite quente próxima à sua varanda. Estava muito frio, mas aquilo a despertava, diferente do clima seco e o barulho de carros que a cidade grande produzia, pensando assim que jamais retornaria algum dia para lá. Descendo as escadas, Holly caminhou até em direção ao seu jardim, de pés descalços, na companhia de seu cachorro, um lindo São Bernardo que gostava de passear com ela em todas as manhãs. Não percebera que, ao aproximar-se de algumas das enormes árvores, seu cachorro, Timmy, parecia incomodado com alguma coisa: Farejando, cavando, latindo, ele ia jogando para cima grama e terra para todos os lados, deixando Holly preocupada e toda suja de areia que, por sua curiosidade já cavava também com suas mãos, quando percebera que era algo que estava enterrado naquele lugar.

O livro se chamava “Ilha dos Vampiros” e parecia está enterrado naquele local do jardim a muitos e muitos anos. Curioso que, quando Holly o tocou, algo estranho sentira em sua mente, mas não conseguia descrever, como se aquele livro tivesse-lhe algo tão familiar. Levou-o então consigo para dentro de casa, manuseando-o, mas com o chamado de Mirian, uma de suas empregadas, largou-o em sua mesa e foi ver o que ela estava precisando.

Quando mais tarde foi ao seu quarto, depois de descansar um pouco em sua banheira, Holly foi até a sua cama e tirou um cochilo. Em seu sonho alguém dizia para acreditar no que pensava, no que via e não deixar tudo para trás, alguém insistia em lhe comunicar algo tão importante mas sempre era levada para longe, como uma garota sendo salva, nos braços de um lindo desconhecido, com roupas pretas e pele pálida, mas não consegue fitar seus olhos. Entre braços fortes, ela voava acompanhada na direção sem fim, sem destino, como o passear dos pássaros por todo o universo.

O livro estava em sua cabeceira quando começou a o manusear. Contava uma história sobre uma sociedade de vampiros que viviam numa floresta distante no norte dos Estados Unidos. “Ilha dos Vampiros”, era como se denominavam, embora não existisse praia, sol e tudo relacionado ao mar, se consideravam como um habitat voltado à total harmonia, igualdade, respeito e muito amor. O livro havia sido de sua avó, como estava assinado em alguma das primeiras páginas, Holly percebera e também haviam muitos manuscritos dela como uma espécie de diário,nele dizia que sua avó era praticante de magia em florestas com um grande grupo até que um dia ficou envolvida num grande romance: um amor correspondido com um vampiro daquela região, numa floresta como aquela, o que deixou Holly completamente assustada e confusa.

Entorpecida por aquela situação e com sua cabeça atormentada, Holly decidira não acreditar mais em nada a respeito daquilo. A sua mente dava voltas e não sentia-se bem com o que lera, estava completamente tomada por um assunto, o qual não queria mesmo admitir. Como um mundo poderia ser guiado por uma total perfeição? Ou como tinha se deixado levar por histórias que só apenas existiam em livros ou em sonhos? Não era alguém que acreditava em algo sobrenatural e muito menos em Deus. E agora muito menos iria acreditar em vampiros ou seres que poderiam existir somente no imaginário popular. Mas Holly percebera que não havia necessidade em está pensando ou dando tanta importância ao que não acreditava, muito menos àquele livro. Deveria voltar a seu trabalho, como muitos já haviam lhe falado. Deveria mudar o rumo de sua vida e mesmo sabendo que viver na cidade, a faria de alguma forma, regressar a todo aquele tédio agonizante. O campo havia sido a sua chave, tinha lhe proporcionado paz e tranqüilidade, muito embora agora sentindo uma angústia em seu peito e a triste solidão que a tomava por completo por maior parte de seu dia. Holly chorou pensando em si mesma e achou por uma vez, que estava ficando louca.
A partir daquele dia começou a sonhar com situações terríveis. Os sonhos não eram mais de paz. A sua solidão e insegurança de vida a fazia começar a produzir os piores pensamentos.

Certa noite, Holly acordara assustada e suando frio. Havia uma gruta, rodeada de vampiros cruéis que a perseguiam com um olhar terrível e ela fugia com todo o medo em seus olhos, até encontrar um penhasco, onde sentia cair e segurava-se, em grande desespero. Tentava salvar Mirian, mas não conseguia, ela parecia morta, com marcas de sangue em quase todo seu corpo e principalmente em seu pescoço. Holly acordou como num pulo e desceu as escadas com maior voracidade e chorando. Foi até o quarto de Mirian, sua empregada, que dormia em paz, como se nada tivesse acontecido.

No dia seguinte, Holly resolvera passar uns tempos na casa de seus pais e voltar um pouco à convivência da cidade grande, mesmo sabendo que não ficaria por lá em definitivo, não sentia-se preparada.

Bem acolhida entre seus pais, que a sempre recebia com enorme carinho, Holly foi passando dias mais calmos e resolvera contar sobre seus sonhos para sua mãe, que tinha uma visão muito profissional sobre aquele assunto.Ela explicava que os sonhos significavam na maioria deles, projeções figurativas de sua realidade e que toda sua angústia e pensamentos atormentados eram resposta de uma só razão: Holly deveria voltar acreditar em si mesma e em tudo que estava em sua volta, deveria ter força de vontade e assim tentar se livrar dos fantasmas de seu inconsciente.

Holly percebera que deveria ter um equilíbrio maior em si mesma e deixar seus medos e aflições para trás. Mesmo assim, quando já voltara para sua casa na floresta, pensara em livrar-se daquele livro que havia a deixado impresionanda e decidira queimá-lo em definitivo, embora quando mexia em uma de suas últimas páginas, percebera um leve inchaço nelas: Algo tinha sido guardado em segredo dentro daquelas páginas próximas à sua capa principal. Na cozinha, Holly pegou uma faca bem afiada e em seguida voltou naquela região do livro e com um corte preciso, começou-o a abrir.

Uma rosa seca saiu de dentro, um colar escuro com as iniciais “IV” e uma carta manuscrita que falava de algo que a surpreendia, era como se fossem as palavras de sua mãe. A tal chamada “Ilha dos Vampiros” assim como o livro mencionava parecia ter existido ou quem sabe ainda existir. Com um mundo repleto de igualdade, fraternidade e muito amor, tinha sido descrita como um certo escritor no passado havia feito em sua importante obra intitulada “Utopia”. Aquela sociedade de vampiros ou pessoas especiais de eterna harmonia, Holly começava a compreender melhor as coisas em sua volta e ver que tudo poderia ser uma metáfora para ela: Um novo sentido para entender melhor seu mundo e sua realidade. Estava sem acreditar mais em nada e isto a tinha levado a ter conflitos consigo mesma em seus pensamentos, não via mais esperanças nas coisas e não acreditava no sentido do amor, alias era o que ultimamente ela havia fugido por muitos e muitos anos. Aquela carta pertencera à sua avó, assim como o livro e que no passado fora uma praticante de magia num grupo que se reuniam sempre numa floresta no norte dos Estados Unidos. Sua avó não acreditava muito em si mesma quando jovem, até que um dia com essas reuniões começou a compreender melhor a si e a vida, até se apaixonara por um desconhecido homem de pele muito clara e olhos cintilantes. Ela descrevia como o amor poderia mudar tudo em sua volta.

Holly sorria ao ler aquilo em suas mãos, recordando que no seu passado nunca havia tido relacionamentos bem sucedidos, tudo para ela era utópico demais, nunca havia provado num só instante um amor correspondido de um homem real, somente imaginário. Em seus sonhos eles sempre estavam presentes, em forma de vampiros ardentes, repletos de desejo e paixão.

**

Num amanhecer de primavera, Holly beirando seus trinta anos de idade, presenciava algo que achara por muitas vezes impossível de acontecer. Uma nova atmosfera em seu jardim brotava ali: Flores por todas as partes coloriam toda a sua volta e pelas margens do lago.

Ela agachava-se e tocava em algumas de suas flores, rosas e muitas delas enfeitando o horizonte de seu jardim. Resolvendo regá-las com um pouco de água, divertia-se em ter descoberto a arte do cultivo das rosas e da jardinagem.

O tempo havia mesmo passado e em toda primavera o seu jardim era o centro de sua beleza: Rosas brotavam junto com sua paz interior. Assim com os fracos raios reluzentes que iluminavam o céu daquela floresta, Holly sorria, mas não compartilhava mais sozinha aquela beleza esplendida, pois do outro lado da margem, o amor estava ao seu lado, exatamente como em seus sonhos, mas agora poderia senti-lo, tocando com todos seus dedos e chamar-lo por seu nome: Louis.

Entre braços fortes, pele pálida e olhos cintilantes, com o cheiro das rosas em seu sobretudo preto, juntos aconchegavam-se em um abraço próximo à lareira, numa noite onde a lua acordara brilhante na imensidão do céu. Num beijo adocicado com lábios vermelho vivo, juntos completavam-se de tanto sentimento e eterna paixão, algo somente visto nos arredores daquela floresta ou quem sabe num mundo fascinante de amor, como na “Ilha dos Vampiros”...