agosto 18, 2011

AVEC TRISTESSE

Clarice faz dias que não sai de seu quarto. Não come regularmente, não arruma mais seus longos cabelos lisos, veste a mesma camisola que tem marcas de tinta em sua volta. Dias e mais dias, deitada à sombra de sua parede, tenta mover-se várias vezes como alguém que tenta e não consegue dormir.

Vivia sonhando e até mesmo sempre acordada. Gostava de pensar na fantasia do impossível, para ela era a única forma de deixar sua mente funcionando e refugiar-se da realidade. Sonhar, era ainda deixar-se viva, pensar no que gostaria de ser e de como queria estar, no entanto, seu espelho mostrava apenas uma jovem despenteada de olhar triste e vestida numa camisola suja de tinta.

O que mais importa agora era sonhar, fechar os olhos e fantasiar uma vida que poderá fazê-la feliz. São somente pensamentos os quais ela sente viva apenas por eles, nada mais parece ter mais sentindo, nada mais existe uma forma de podê-la tirar daquele instante de ares melancólicos.

Os momentos de solidão já tinham-se passados como costume e companhia para Clarice, embora antes poderia se recordar que existira uma vida diferente daquele momento. Por muitos anos tinha levado uma vida feliz e normal para uma garota na sua idade. Tinha estudado em escola particular, onde a maioria das pessoas de maior poder aquisitivo de sua cidade colocavam seus filhos para ter um bom comportamento social, além das disciplinas básicas, aprendiam muito com aulas de boas maneiras, francês e artes plásticas. Os pais de Clarice haviam se separado quando ela tinha apenas dois anos de idade. Jamais conhecera como era ter uma vida com um pai ao seu lado, mesmo depois com a separação, Clarice só veio ter mais contato com seu pai, por decisão dele próprio e por motivo o qual ela totalmente desconhece até seu momento. Somente quase depois de adulta e graduada em Artes, mesmo tendo ouvido muito que isto não lhe daria futuro algum, de alguma maneira viu seu pai se aproximar de certa forma, recordando que gostaria mesmo que ele tivesse a acompanhado por toda infância, algo que ele nunca o fez.

Não valeria apenas ficar em seu quarto despenteada e pensando em tudo que já houvera acontecido, o passado não importava mais, também não costumava pensar no futuro, era uma incógnita que nem nós mesmos sabemos que pode acontecer, sentia-se no presente e tentava fugir dele de uma certa forma, fechando seus olhos era o que mais queria, para fugir da realidade e trancar-se em seus pensamentos como uma garota que deseja ser uma Dorothy no mundo de Oz e não sair nunca mais do mundo da fantasia, só aquilo era que a deixaria feliz.

Mesmo recordando que a vida lhe tinha propocionado tantos momentos de alegria, Clarice sempre estivera sozinha. No momento que as garotas da sua escola se preocupavam em serem líderes de torcida, seu passatempo preferido era ficar horas detrás da biblioteca escrevendo em seu diário ou às vezes na companhia de sua melhor amiga, Lilly, tocando violão e ouvindo Led Zeppellin e os clássicos do rock dos anos setenta.

Tinha sido uma época mágica de uma certa forma, ela e sua melhor amiga de escola passavam a maior parte do tempo grudadas, a adolescência tinha sido atormentada e inesquecível, os momentos das roupas extravagantes, dos pentiados exóticos, dos passeios em shopping centers aos sábados e das noites vendo filmes e vídeo-clips regados a pizza e cerveja que Lilly trazia de casa e passavam juntas o resto do domingo no apartamento da tia de Clarice, onde ela mais costumava ficar e adorava. Só não conseguira entender o porquê conforme os anos passam muitas pessoas mudam seus comportamentos e amizades que poderiam ser eternas morrem do nada, sem explicação, como alguém que era de uma certa forma e hoje sente-se intocável e coberto de ouro e finge em não recordar e fazer que não existira o passado. Realmente a maioria das pessoas são egoístas e difíceis de entender.

Lembranças e tantas lembranças, amigos que vinham, amigos que iam embora da vida, na maioria sem nenhum motivo a declarar, outros por não continuar sendo o que realmente eram, pessoas capazes de parar o carro na sua frente e fingir que não lhe conhece, só o fato de estar com uma boa vida social destacada e sentir-se “maior” do que os outros. Que belas almas tristes!

Clarice continuava em seu quarto próximo ao fim de tarde, sentada próximo á janela para ver um lindo pôr-do-sol que se aproximava em seus olhos. Mas nada parecia fazer mais sentido em sua volta, somente se encontrava na companhia de seus pensamentos que a fazia continuar naquele lugar sem mais brilho, sem mais estrelas.

O pôr-do-sol do final das tardes tinha se tornado seu único amigo para todos aqueles dias que sentira sozinha nos dias de calor e até mesmo nos dias de frio, onde a névoa dificultava a linda vista do horizonte, era como se o céu estivesse chorando diante da presença daquele mundo povoado por tantas almas cruéis e sem amor, sem companhia ao próximo.

Era difícil cultivar por muito tempo uma amizade neste mundo de tantas almas frias, era difícil ter um amor correspondido entre tantos ou um simples “bom dia” de alguém especial. Poderia também encontrar poucas pessoas especiais dentro deste mundo de almas tristes, só que apenas para quem sentira corresponder e dar a importância ao carinho que transmitirmos, era algo quase inexistente.

Pessoas que surgiam em nossas vidas e que um dia nos passa a se tornar parte de nós mesmos, pessoas adoráveis que passamos a amar de verdade e que um dia percebemos que elas preferem dar muito mais importância aos objetos supérfluos da vida e de gente sem amor. Já ouviu falar em pessoas que estão com alguém só pelo fato que é jovem, bonita e para apenas exibir aos outros como troféu, como um grande prêmio alcançado?! Às vezes acabamos percebendo que estamos amando alguém assim, que não enxergam com os próprios olhos da vida, apenas para o descartavél, apenas para o fútil e nos desgastamos, amando, amando incondicionalmente e sem ser correspondido este amor e sem sermos percebido nossa importância. Que mundo cheio de almas tristes!

Clarice joga seu mundo à entrega da solidão, da tristeza e melancolia como parceiras de uma vida que deseja fugir da realidade, como alguém que deseja construir um mundo de fantasia e nunca mais sair dele. A única coisa que quer é fechar seus olhos e deitar-se num profundo sono. Ao lado de sua cabeceira fica um anjo de porcelana com uma luz em seu interior como um abajur sofisticado, luz a qual ilumina sua volta, seu quarto e rega seus pensamentos adormecidos.

Fecha os olhos e sente-se em paz como se estivesse construindo seu próprio universo, aquele secreto que ninguém mais a pertubaria, ninguém mais poderia magoá-la.

Na fraca luz de seu anjo de porcelana ao lado da cabeceira, perde-se em seus sonhos e seus pensamentos de fantasia, deixando seu inconsciente a levar para onde ela mais quer estar, bem distante, numa nuvem fofinha rodeada de anjos cantores em sua volta e em seu colo, um anjo de olhos de príncipe, o qual ela sorrir e toca seus cabelos perfumados diante ao pôr-do-sol, juntos à imensidão do universo de amor e ao espaço sideral das nuvens da amizade, retomando-a enfim à um novo sentido, na sensação de um presente iluminado pelos raios do sol da manhã; é acordada num beijo sussurrado de um lindo dia harmonioso de luz, diferente de tudo que vivera e junto à tudo que sonhara...


(Joyce Martins)